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30/08/11

Inconfesso Desejo ...

Queria ter coragem
para falar deste segredo,
queria poder declarar ao mundo
Este amor.
Não me falta vontade
não me falta desejo
você é minha vontade
meu maior desejo.
Queria poder gritar
esta loucura saudável
que é estar em teus braços
perdido pelos teus beijos
sentindo-me louco de desejo.
Queria recitar versos
cantar aos quatros ventos
as palavras que brotam
você é a inspiração
minha motivação.
Queria falar dos sonhos
dizer os meus secretos desejos
que é largar tudo
para viver com você
este inconfesso desejo.

(Carlos Drummond de Andrade)






AMOR...



Amemos! Quero de amor
viver no teu coração!
Sofrer e amar essa dor
que desmaia de paixão!

Na tu'alma, em teus encantos
e na tua palidez
e nos teus ardentes prantos
suspirar de languidez!

Quero em teus lábio beber
os teus amores do céu,
quero em teu seio morrer
no enlevo do seio teu!

Quero viver d'esperança,
quero tremer e sentir!
Na tua cheirosa trança
quero sonhar e dormir.
Vem, anjo, minha donzela,
minha'alma, meu coração!

Que noite, que noite bela!
Como é doce a viração,
e entre os suspiros do vento
da noite ao mole frescor,
quero viver um momento,
morrer contigo de amor!

(Álvares de Azevedo)

29/08/11

Nós Estamos Num estado Comparável á Grécia...



Nós estamos num estado comparável, correlativo à Grécia: mesma pobreza, mesma indignidade política, mesmo abaixamento dos caracteres, mesma ladroagem pública, mesma agiotagem, mesma decadência de espírito, mesma administração grotesca de desleixo e de confusão. Nos livros estrangeiros, nas revistas, quando se quer falar de um país católico e que pela sua decadência progressiva poderá vir a ser riscado do mapa – citam-se ao par a Grécia e Portugal. Somente nós não temos como a Grécia uma história gloriosa, a honra de ter criado uma religião, uma literatura de modelo universal e o museu humano da beleza da arte.



Eça de Queirós,
( Palavras de um visionário )

Ondas de Solidão



Se possuísse uma canoa e um papagaio, podia considerar-me realmente como um Robinson Crusoé, desamparado na sua ilha. Há, é verdade, em roda de mim uns quatro ou cinco milhões de seres humanos. Mas, que é isso? As pessoas que nos não interessam e que se não interessam por nós, são apenas uma outra forma da paisagem, um mero arvoredo um pouco mais agitado. São, verdadeiramente como as ondas do mar, que crescem e morrem, sem que se tornem diferenciáveis uma das outras, sem que nenhuma atraia mais particularmente a nossa simpatia enquanto rola, sem que nenhuma, ao desaparecer, nos deixe uma mais especial recordação. Ora estas ondas, com o seu tumulto, não faltavam decerto em torno do rochedo de Robinson - e ele continua a ser, nos colégios e conventos, o modelo lamentável e clássico da solidão.



Eça de Queirós




28/08/11

Eça de Queirós




«Estamos perdidos há muito tempo...
O país perdeu a inteligência e a consciência moral.
Os costumes estão dissolvidos, as consciências em debandada.
Os caracteres corrompidos.
A prática da vida tem por única direcção a conveniência.
Não há princípio que não seja desmentido.
Não há instituição que não seja escarnecida.
Ninguém se respeita.
Não há nenhuma solidariedade entre os cidadãos.
Ninguém crê na honestidade dos homens públicos.
Alguns agiotas felizes exploram.
A classe média abate-se progressivamente na imbecilidade e na inércia.
O povo está na miséria.
Os serviços públicos são abandonados a uma rotina dormente.
O Estado é considerado na sua acção fiscal como um ladrão e tratado como um inimigo.
A certeza deste rebaixamento invadiu todas as consciências.
Diz-se por toda a parte: “o país está perdido!”
Algum opositor do actual governo?... Não!»

Deixo-vos com as palavras sábias e ainda actuais de Eça de Queirós que se aplica muito bem aos dias de hoje, e ao estado que se encontra o nosso país...







Memórias de Infância


As minhas férias de verão:

Aqueles magníficos  meses de verão, onde eu e os meus pais íamos acampar. Meu pai tinha uma enorme tenda familiar onde cabia o pessoal todo se fosse preciso,e lá iamos nós para uma fantástica mata na fonte-da-telha onde as pessoas podiam montar suas tendas e passar ali uns bons e agradáveis momentos de férias. Havia alturas em que os meus irmãos se juntavam para grandes almoçaradas. Praia, descanso, divertimento, umas sestas pelo meio, e assim passavamos um dia em beleza. Depois mais tarde, o meu  arranjou um casinha minúscula mesmo no centro da costa da caparica, onde aí fizemos mais umas temporadas de verão. Havias dias em que eu e os meus pais iamos de manhã cedo esperar os pescadores que vinham da pesca. Os barcos vinham cheios de bom peixe ainda a saltitar, as pessoas juntava-se todas á volta dos barcos para escolher o seu peixe, era uma alegria de ver, como também tinhamos o prazer de comer  peixe fresquinho quase todos os dias. E foi assim durante mais algum tempo as minhas férias de verão passadas com os meus pais na minha adolescência.

Nanda


27/08/11

Memórias de Infância


A Minha Queda de Bicicleta



Lembro-me que tinha aprendido a andar de bicicleta, quando um belo dia, pego nela e vou aventurar-me sózinha ainda com pouca experiência a dar as minhas voltas. Quando ao fim de um certo tempo, vejo-me a ir por um caminho que foi dar a uma acentuada descida  e a ir a uma velocidade que não consegui controlar de maneira nenhuma a dita cuja; e dou comigo esticada no chão. Foi uma queda de tal maneira, que fiz um enorme golpe num dos joelhos. A partir dessa altura, nunca mais peguei numa bicicleta, o medo de cair foi de tal forma, que ainda hoje tenho um pavor a quedas. Sempre que me lembro destas pequenas situações farto-me de rir para mim mesma, e o mais engraçado é que deixei de saber andar de bicicleta. Hoje, se eu pegar numa bicicleta terei que novamente aprender a andar, mas desta vez terei que praticar mais e mais até me sentir segura e saber controlar a máquina.

Nanda

26/08/11

A SOLIDÃO

A solidão...

Quem me tira destas quatros paredes,
Quem me tira desta solidão imensa.
Sinto uma enorme sensação de vazio e isolamento.
Não é só a falta de alguém ao nosso lado,
Mas os meus sentimentos precisam de algo novo,
Que me dê alegria, satisfação de estar dando algo de mim aos outros.
Poder sair, ver novas caras, novos sorrisos, apanhar ar!
Poder realizar alguma actividade.
Mas sobretudo, ganhar o meu sustento, a minha liberdade,
A minha estabilidade emocional, física e mental em harmonia.


Nanda


25/08/11

Quando Ela Fala...

Quando ela fala, parece
que a voz da brisa se cala;
talvez um anjo emudece
quando ela fala.

Meu coração dolorido
as suas mágoas exala,
e volta ao gozo perdido
quando ela fala.

Pudeste eu eternamente,
o lado dela, escutá-la,
ouvir sua alma inocente
quando ela fala.

Minha alma, já semimorta,
conseguira ao céu alçá-la
porque o céu abre uma porta
quando ela fala.

Machado de Assis

ABANDONO


Não digas nada, deixa apenas
as mãos entregues ao calor das minhas
e olha-me nos olhos como quando
nos fitávamos, pássaros surpresos
do próprio voo, adolescente e luminoso.

Ambos sabemos desde há muito: a vida
é uma longa paciência e não há forma
de viver ao abandono dos que amamos.

Sobrevivamos, pois, no fio dos dias
que nos restam ainda, se é que o tempo
nos favorece como dantes.
E mantenhamos as mãos coladas,
olhares fitos um no outro, meu amor.

(Torquato da Luz)


24/08/11

Pus o Meu Sonho Num Navio...


Pus o meu sonho num navio
e o navio em cima do mar;
depois, abri o mar com as mãos,
para o meu sonho naufragar

Minhas mãos ainda estão molhadas
do azul das ondas entreabertas,
e a cor que escorre de meus dedos
colore as areias desertas.

O vento vem vindo de longe,
a noite se curva de frio;
debaixo da água vai morrendo
meu sonho, dentro de um navio...

Chorarei quanto for preciso,
para fazer com que o mar cresça,
e o meu navio chegue ao fundo
e o meu sonho desapareça.

~Cecília Meireles~






Memórias de Infância



Um dia destes dias, estava eu no computador e de repente, veio-me á memória lembranças da minha infância.

Uma delas, que eu adorava e ainda hoje continuo a gostar, embora já não faça parte das nossas casas modernas e nos costumes domésticos, era lavar a roupa á mão num daqueles tanques antigos de cimento, que existiam nas casas. Eu era pequena, e via a minha mãe na marquise da nossa cozinha lavar a roupa á mão.

Ela esfregava e esfregava, batia a roupa na pedra, ensaboava, e tornava a bater, e a esfregar, eram gestos que se repetiam vezes sem conta até a roupa ficar bem lavada. O gosto que eu tinha de ver a minha mãe lavar a roupa daquela forma era de tal forma para mim tão agradável que a partir daquele momento iria ser uma das minhas funções favoritas lá de casa. A roupa ficava incrivelmente branca e bem lavada com o sabão azul e branco que se usava naquele tempo.

O cheirinho da roupa lavada com aquele sabão era muito bom, e mesmo depois de seca o cheirinho ficava na roupa. Era também com esse sabão azul e branco que tomávamos banho, pois dizia-se naquele tempo, que o sabão era bom para a pele, até os próprios médicos aconselhavam o uso do mesmo. E era bem verdade; claro que as coisas vão-se alterando e o sabão azul e branco de hoje, nada tem a ver com o de antigamente, completamente diferente na sua composição e cheiro. São estas pequenas lembranças mas muito significativas para mim, que me faz sentir saudades do meu tempo de criança e adolescente

Ouve, Meu Anjo...



Ouve, meu anjo:
Se eu beijasse a tua pele?
Se eu beijasse a tua boca
onde a saliva é mel?
Tentou, severo, afastar-se
num sorriso desdenhoso;
Mas aí!, A carne do assassino
é como a do virtuoso.
Numa atitude elegante,
misterioso, gentil,
deu-me o seu corpo doirado
que eu beijei quase febril.
Na vidraça da janela,
A chuva, leve, tinia…
Ele apertou-me cerrando
os olhos para sonhar -
E eu lentamente morria
como um perfume no ar!



~António Botto~




Na Palma da Tua Mão


E na palma da tua mão
busco ternura
sem contar meses,
anos,dias,
sem saber dizer
se já te chorei
por inteiro
o suficiente
para não voltar
a perder-te.



~Vasco Gato~



Plena Mulher



Plena mulher maçã carnal, lua quente,
espesso aroma de algas, lodo e luz pisados,
que obscura claridade se abre entre tuas pernas?

Que antiga noite o homem toca com seus sentidos?
Ai, amar é uma viagem com água e com estrelas,
com ar opresso e bruscas tempestades de farinha:
amar é um combate de relâmpagos e dois corpos
por um só mel derrotados.

Beijo a beijo percorro teu pequeno infinito,
tuas margens, teus rios, teus povoados pequenos,
e o fogo genital transformado em delícia
corre pelos ténues caminhos do sangue
até precipitar-se como um cravo nocturno,
até ser e não ser senão na sombra de um raio.

Pablo Neruda



De Todos os Cantos do Mundo


Amo com um amor mais forte e mais profundo

Aquela praia extasiada e nua

Onde me uni ao mar, ao vento e à lua.

Sophia Andresen

SAUDADE

Magoa-me a saudade
do sobressalto dos corpos
ferindo-se de ternura,
dói-me a distante lembrança
do teu vestido
caindo aos nossos pés.

Magoa-me a saudade
do tempo em que te habitava
como o sal ocupa o mar
como a luz recolhendo-se
nas pupilas desatentas.

Seja eu de novo a tua sombra, teu desejo
tua noite sem remédio
tua virtude, tua carência
eu…
que longe de ti sou fraco
 eu…
que já fui água, seiva vegetal
sou agora gota trémula, raiz exposta.

Traz
de novo, meu amor
a transparência da água
dá ocupação à minha ternura vadia
mergulha os teus dedos
no feitiço do meu peito
e espanta na gruta funda de mim
os animais que atormentam o meu sono.


Mia Couto

21/08/11

Limites do Amor



Condenado estou a te amar
nos meus limites
até que exausta e mais querendo
um amor total, livre das cercas,
te despeça de mim, sofrida,
na direção de outro amor
que pensas ser total e total será
nos seus limites da vida.

O amor não se mede
pela liberdade de se expor nas praças
e bares, em empecilho.
É claro que isto é bom e, às vezes,
sublime.

Mas se ama também de outra forma, incerta,
e este o mistério:
- ilimitado o amor às vezes se limita,
proibido é que o amor às vezes se liberta.



Faz-me o Favor.



Faz-me o favor de não dizer
absolutamente nada!
Supor o que dirá
Tua boca velada
É ouvir-te já.

É ouvir-te melhor
Do que o dirias.
O que és nao vem à flor
Das caras e dos dias.

Tu és melhor -- muito melhor!--
Do que tu. Não digas nada. Sê
Alma do corpo nu
Que do espelho se vê.


Mário Cesariny







Há Palavras Que Nos Beijam


Há palavras que nos beijam
Como se tivessem boca,
Palavras de amor, de esperança,
De imenso amor, de esperança louca.

Palavras nuas que beijas
Quando a noite perde o rosto,
Palavras que se recusam
Aos muros do teu desgosto.

De repente coloridas
Entre palavras sem cor,
Esperadas, inesperadas
Como a poesia ou o amor.

(O nome de quem se ama
Letra a letra revelado
No mármore distraído,
No papel abandonado)

Palavras que nos transportam
Aonde a noite é mais forte,
Ao silêncio dos amantes
Abraçados contra a morte.

Alexandre O´Neill



14/08/11

ESTAR SÓ...

Esta solidão que me faz sofrer

Olho para dentro de mim

E nada vejo, só um vazio assim.

Estou cansada, abatida de coração

Tenho saudades de ter um carinho

Um gesto, um mimo,

De andar de mão dada na rua

Do nome do amor mil vezes escrever

Na minha alma sem querer

Saudades de sentir um aperto

Quando o ser amado não esta perto.

Quero ver alguém aqui ao meu lado

E sentir um abraço apertado

Hoje, só agora, neste momento, todo o sempre

Sentir o calor de um corpo sem tormento

Sentir a respiração no meu ouvido.

Estou sozinha, no vazio, sem perceber

Este silêncio que me deixa perdida na incerteza

Num mar de angústia e tristeza

Queria apenas não estar sozinha

Na noite que já se avizinha

Ver um rosto, um sorriso, um olhar.

                                                                              Nanda

11/08/11

Esta é a Forma Fêmea...

Esta é a forma fêmea:
dos pés à cabeça dela exala um halo divino,
ela atrai com ardente
e irrecusável poder de atracão,
eu me sinto sugado pelo seu respirar
como se eu não fosse mais
que um indefeso vapor
e, a não ser ela e eu, tudo se põe de lado.

— Artes, letras, tempos, religiões,
o que na terra é sólido e visível,
e o que do céu se esperava
e do inferno se temia,
tudo termina:
estranhos filamentos e renovos
incontroláveis vêm à tona dela,
e a acção correspondente
é igualmente incontrolável;
cabelos, peitos, quadris,
curvas de pernas, displicentes mãos caindo
todas difusas, e as minhas também difusas,
maré de influxo e influxo de maré,
carne de amor a inturgescer de dor
deliciosamente,
inesgotáveis jactos límpidos de amor
quentes e enormes, trémula geleia
de amor, alucinado
sopro e sumo em delírio;
noite de amor de noivo
certa e maciamente laborando
no amanhecer prostrado,
a ondular para o presto e proveitoso dia,
perdida na separação do dia
de carne doce e envolvente.

Eis o núcleo — depois vem a criança
nascida de mulher,
vem o homem nascido de mulher;
eis o banho de origem,
a emergência do pequeno e do grande,
e de novo a saída.

Não se envergonhem, mulheres:
é de vocês o privilégio de conterem
os outros e darem saída aos outros
— Vocês são os portões do corpo
e são os portões da alma.

A fêmea contém todas
as qualidades e a graça de as temperar,
está no lugar dela e movimenta-se
em perfeito equilíbrio,
ela é todas as coisas devidamente veladas,
é ao mesmo tempo passiva e activa,
e está no mundo para dar ao mundo
tanto filhos como filhas,
tanto filhas como filhos.

Assim como na Natureza eu vejo
minha alma reflectida,
assim como através de um nevoeiro,
eu vejo Uma de indizível plenitude
e beleza e saúde,
com a cabeça inclinada e os braços
cruzados sobre o peito
— a Fêmea eu vejo.

Walt Whitmam
(A poesia de Walt é um estimulo para o intelecto e sensibilidade.)

09/08/11

Nocturnamente


Nocturnamente te construo
para que sejas palavra do meu corpo.
Peito que em mim respira
olhar em que me despojo
na rouquidão da tua carne
me inicio
me anuncio
e me denuncio.
Sabes agora para o que venho
e por isso me desconheces

Mia Couto

O Beijo e a Lágrima



Quero um beijo, pediu ela.
Um sismo
abalou o peito dele.
E devotou o calor
de lava dos seus lábios,
entontecida água na cascata.
Entusiamado,
ele se preparou para, de novo,
duplicar o corpo e regressar à vertigem do beijo.
Mas ela o fez parar.
Só queria um beijo.
Um único beijo para chorar.
Há anos que não pranteava.
E a sua alma se convertia
em areia do deserto.
Encantada,
ela no dedo recolheu a lágrima.
E se repetiu o gesto
com que Deus criou o Oceano

Mia Couto

Solidão




Aproximo-me da noite
o silêncio abre os seus panos escuros
e as coisas escorrem
por óleo frio e espesso

Esta deveria ser a hora
em que me recolheria
como um poente
no bater do teu peito
mas a solidão
entra pelos meus vidros
e nas suas enlutadas mãos
solto o meu delírio

É então que surges
com teus passos de menina
os teus sonhos arrumados
como duas tranças nas tuas costas
guiando-me por corredores infinitos
e regressando aos espelhos
onde a vida te encarou

Mas os ruídos da noite
trazem a sua esponja silenciosa
e sem luz e sem tinta
o meu sonho resigna

Longe
os homens afundam-se
com o caju que fermenta
e a onda da madrugada
demora-se de encontro
às rochas do tempo

Mia Couto,

08/08/11

CONFIDÊNCIA


Diz o meu nome
pronuncia-o
como se as sílabas te queimassem os lábios
sopra-o com suavidade
para que o escuro apeteça
para que se desatem os teus cabelos
para que aconteça

Porque eu cresço para ti
sou eu dentro de ti
que bebe a última gota
e te conduzo a um lugar
sem tempo nem contorno

Porque apenas para os teus olhos
sou gesto e cor
e dentro de ti
me recolho ferido
exausto dos combates
em que a mim próprio me venci

Porque a minha mão infatigável
procura o interior e o avesso
da aparência

porque o tempo em que vivo
morre de ser ontem
e é urgente inventar
outra maneira de navegar
outro rumo outro pulsar
para dar esperança aos portos
que aguardam pensativos

No úmido centro da noite
diz o meu nome
como se eu te fosse estranho
como se fosse intruso
para que eu mesmo me desconheça
e me sobressalte
quando suavemente
pronunciares o meu nome

Mia Couto

07/08/11

PARA TI


Foi para ti
que desfolhei a chuva
para ti soltei o perfume da terra
toquei no nada
e para ti foi tudo.

Para ti criei todas as palavras
e todas me faltaram
no minuto em que falhei
o sabor do sempre.

Para ti dei voz
às minhas mãos
abri os gomos do tempo
assaltei o mundo
e pensei que tudo estava em nós
nesse doce engano
de tudo sermos donos
sem nada termos
simplesmente porque era de noite
e não dormíamos
eu descia em teu peito
para me procurar
e antes que a escuridão
nos cingisse a cintura
ficávamos nos olhos
vivendo de um só olhar
amando de uma só vida.

Mia Couto

06/08/11

Musica


Divina Música!
Filha da Alma e do Amor.
Cálice da amargura
E do Amor.
Sonho do coração humano,
Fruto da tristeza.
Flor da alegria, fragrância
E desabrochar dos sentimentos.
Linguagem dos amantes,
Confidenciadora de segredos.
Mãe das lágrimas do amor oculto.
Inspiradora de poetas, de compositores
E dos grandes realizadores.
Unidade de pensamento dentro dos fragmentos
Das palavras.
Criadora do amor que se origina da beleza.
Vinho do coração
Que exulta num mundo de sonhos.
Encorajadora dos guerreiros,
Fortalecedora das almas.
Oceano de perdão e mar de ternura.
Ó música.
Em tuas profundezas
Depositamos nossos corações e almas.
Tu nos ensinaste a ver com os ouvidos
E a ouvir com os corações.

Gibran


04/08/11

Tua Caminhada


Tua caminhada ainda não terminou....
A realidade te acolhe
dizendo que pela frente
o horizonte da vida necessita de tuas palavras
e do teu silêncio.

Se amanhã sentires saudades,
lembra-te da fantasia e
sonha com tua próxima vitória.

Vitória que todas as armas do mundo
jamais conseguirão obter,
porque é uma vitória que surge da paz
e não do ressentimento.

É certo que irás encontrar situações
tempestuosas novamente,
mas haverá de ver sempre
o lado bom da chuva que cai
e não a faceta do raio que destrói.

Tu és jovem.
Atender a quem te chama é belo,
por quem te rejeita
é quase chegar a perfeição.
A juventude precisa de sonhos
e se nutrir de lembranças,
assim como o leito dos rios
precisa da água que rola
e o coração necessita de afeto.

Não faças do amanhã
o sinônimo de nunca,

nem o ontem te seja o mesmo
que nunca mais.
Teus passos ficaram.
Olhes para trás...
mas vá em frente
pois há muitos que precisam
que chegues para poderem seguir-te.

- Charles Chaplin -

02/08/11

Sonho


Sonhe com as estrelas, mas apenas sonhe
elas só podem brilhar no céu.
Não tente deter o vento,
ele precisa correr por toda a parte,
ele tem pressa de chegar, sabe-se lá aonde.

As lágrimas?Não as seque,
elas precisam correr na minha,
na sua, em todas as faces.
O sorriso! Esse, você deve segurar,
não o deixe ir embora, agarre-o!

Persiga um sonho, mas não o deixe viver sozinho.
Alimente a sua alma com amor,
cure as suas feridas com carinho.
Descubra-se todos os dias,
deixe-se levar pelas vontades,
mas não enlouqueça por elas.

Abasteça seu coração de fé, não a perca nunca.
Alague seu coração de esperanças, mas
não deixe que ele se afogue nelas.
Se achar que precisa voltar, volte!
Se perceber que precisa seguir, siga!
Se estiver tudo errado, comece novamente.

Se estiver tudo certo, continue!
Se sentir saudades, mate-as.
Se perder um amor, não se perca!
Se o achar, segure-o!
Circunda-se de rosas, ama, e cala.
O mais é "nada".


Fernando Pessoa

Vidas...

Nós vivemos num mundo de espelhos,
mas os espelhos roubam nossa imagem...
Quando eles se partirem numa infinidade de estilhas
seremos apenas pó tapetando a paisagem.

Homens virão, porém, de algum mundo selvagem
e, com estes brilhantes destroços de vidro,
nossas mulheres se adornarão, seus filhos
inventarão um jogo com o que sobrar dos ossos.

E não posso terminar a visão
porque ainda não terminou o soneto
e o tempo é uma tela que precisa ser tecida...

Mas quem foi que tomou agora o fio da minha vida?
Que outro lábio canta, com a minha voz perdida,
nossa eterna primeira canção?!

Mario Quintana


Do Primeiro Olhar, Do Primeiro Beijo, Do Casamento.


~ Do Primeiro Olhar ~

É aquele momento em que a Vida passa da sonolência para a alvorada. É a primeira chama que ilumina o íntimo mais profundo do coração. É a primeira nota mágica arrancada das cordas de prata do sentimento. É aquele momento instantâneo em que se abrem diante da alma as crônicas do Tempo, e se revelam aos olhos as proezas da noite, e as vozes da consciência. Ele é que abre os segredos da Eternidade para o futuro. É a semente lançada por Ishtar, deusa do Amor, e espargida pelos olhos do ser amado na paisagem do Amor, depois regada e cuidada pela afeição, e finalmente colhida pela alma.
O primeiro olhar vindo dos olhos do ser amado é como o espírito que se movia sobre a face das águas e deu origem ao céu e à terra, quando o Senhor sentenciou: "E agora, vivei!"


~ Do Primeiro Beijo ~


É o primeiro gole de néctar da Vida, numa taça ofertada pela divindade. É a linha divisória entre a dúvida que engana o espírito e entristece o coração, e a certeza que inunda de alegria nosso íntimo. É o começo da canção da Vida e o primeiro ato do drama do Homem Ideal. É o vínculo que une a obscuridade do passado com a luminosidade do futuro; é a ponte entre o silêncio dos sentimentos e a sua própria melodia. É uma palavra pronunciada por quatro lábios, proclamando o coração um trono, o Amor um rei e a fidelidade uma coroa. É o toque leviano dos dedos delicados da brisa nos lábios da rosa — pronunciando um longo suspiro de alívio e um suave gemido.
É o começo daquela vibração mágica que transporta os amantes do mundo das coisas e dos seres para o mundo dos sonhos e das revelações.
É a união de duas flores perfumadas; e a mistura de suas fragrâncias, para a criação de uma terceira alma.
Assim como o primeiro olhar é uma semente lançada pela divindade no campo do coração humano, assim o primeiro beijo é a primeira flor nascida na ponta dos ramos da Árvore da Vida.


~ Do Casamento ~


Aqui o Amor começa a traduzir a prosa da Vida em hinos e cânticos de louvor, com música que é preparada à noite para ser cantada durante o dia. Aqui a força do amor despe-se dos seus véus, e ilumina todos os recessos do coração, criando uma felicidade que só é excedida pela da Alma quando se encontra com Deus.
O casamento é a união de duas divindades para dar nascimento a uma terceira na terra. É a união de duas almas num amor tão forte que possa abolir qualquer separação. É aquela superior unidade que junta as metades antes separadas, de dois espíritos. É o elo de ouro de uma cadeia cujo começo é um olhar, e cujo fim é a eternidade. É a chuva pura que cai de um céu perfeito para frutificar e abençoar os campos da divina Natureza.Assim como o primeiro olhar entre os que se amarão é como uma semente lançada no coração humano, e o primeiro beijo de seus lábios uma flor nos ramos da árvore da vida, também a união de dois amantes pelo casamento é como o primeiro fruto da primeira flor daquela semeadura.


Gibran Kahlil

01/08/11

Os Filhos


Vossos filhos não são vossos filhos.
São os filhos e as filhas da ânsia da vida por si mesma.
Vêm através de vós, mas não de vós.
E embora vivam convosco, não vos pertencem.

Podeis dar-lhes vosso amor, mas não vossos pensamentos,
Porque eles têm seus próprios pensamentos.
Podeis abrigar seus corpos, mas não suas almas;
Pois suas almas moram na mansão do amanhã,

Que vós não podeis visitar nem mesmo em sonho.
Podeis esforçar-vos por ser como eles,

Mas não procureis fazê-los como vós,
Porque a vida não anda para trás e não se demora com

Os dias passados.
Vós sois os arcos dos quais vossos filhos são arremessados

Como flechas vivas.

O arqueiro mira o alvo na direcção do infinito e vos estica

Com toda a sua força para que suas flechas se projectem rápidas
E para longe.Que vosso encurvamento na mão do arqueiro
Seja vossa alegria:
Pois assim como ele ama a flecha que voa,
Ama também o arco que permanece estável.


Gibran Kahlil Gibran